quarta-feira, 28 de maio de 2014

Quando eu era Educadora Social. parte 03

     Quando eu era Educadora Social, por algum tempo trabalhei com uma senhora chamada Judith. Pessoa muito religiosa e de bom coração, passei a pensar nela como uma segunda mãe, carente de mãe que sempre fui....Ela tinha um dom especial, de sempre ir ao encontro de quem mais precisava. Passava a mão em nossos arquivos e dizia:- Precisamos ver essa família, agora! E quando a gente chegava lá, era uma certeza, havia algo que precisávamos fazer naquele momento para ajudar.
      Um dia ela falou que havia recebido o pedido de uma "irmã" de sua igreja, para que a gente fosse visitar uma família que estava passando fome, com as crianças fora da escola, com problemas de saúde:
 - Vamos lá, na casa da irmã Maria, que ela vai nos levar até a família que necessita de atendimento.
 E assim foi. Ao chegar na casa desta senhora, fiquei muito constrangida. Eu não podia olhar nos olhos daquela mulher. Batia um desespero, era como se os olhos dela não fossem humanos. Eram bonitos, azuis. E fui ficando cada vez mais constrangida.Meu coração batia mais forte que o normal. Era como se estivesse vendo algo que não podia ver. Angustiada, chamei a Judith num canto e contei para ela como eu estava me sentindo. Então ela sorriu e disse para eu perguntar para dona Maria o porquê daquilo. Imagina. Como eu perguntaria a alguém o que havia de estranho com ela a ponto de eu não poder olhar em seus olhos? Permaneci quieta. Fomos até a casa da família que seria atendida. Havíamos levado uma cesta básica, que entregamos, fizemos as fichas, coisas de rotina. Eu quieta. Chateada.
        - Irmã Maria, por favor, a Desi achou algo estranho nos seus olhos, disse para mim que não consegue nem olhar para eles...Por que não conta sua história?
Eu queria me enfiar debaixo da Kombi da prefeitura! Mas a senhora, apenas deu um sorriso, pediu que eu entrasse em sua casa, abriu uma caixa e começou a me mostrar algumas coisas. Mostrou um daqueles cartões que se entregam em velórios, uma cópia de certidão de óbito e uma foto. A mulher da foto, usava óculos e se parecia muito com ela, embora seus olhos fossem castanhos. Então me contou sua história:
        - Sabe, Desi, eu tinha um problema muito sério no coração. Ia fazer uma cirurgia. Mas morri, antes disso! Meus filhos prepararam o velório, levaram meu corpo para a capela do cemitério. Os irmãos da Igreja foram chegando, esperando o pastor para uma última oração. Então eu voltei a vida! Sem nenhum problema no coração! Apenas levantei do caixão, depois do que imaginei ser um sonho bom, onde os anjos do senhor me recebiam...Levantei, tateando pelos meus óculos, porque antes de morrer eu tinha uma alta miopia. Mas percebi que estava vendo perfeitamente sem eles. Só aí dei conta de que levantava de um caixão. Meus filhos choravam, os irmãos gritavam que era um milagre...Os médicos nunca deram explicação para o que aconteceu.Eu acho que era pra mim voltar mesmo, para dar meu testemunho na igreja. Não sei ao certo. Só sei que acordei curada, sem miopia e com os olhos azuis...
          Eu acreditei em cada palavra daquela mulher, até porque a Judith havia conhecido ela antes de sua "morte", e era uma pessoa de quem eu jamais duvidaria da palavra. E também havia o fato incontestável de que eu tinha a impressão de que alguém havia arrancado os olhos de outra pessoa e colocado na dona Maria.
          Hoje existem cirurgias capazes de mudar a cor dos olhos. Um fato como esse, apareceria nas redes sociais. Naquele tempo, porém não havia nada disso. Foi um acontecimento que não chegou na Tv, até porque na religião de Judith e dona Maria não se assiste Tv...O que eu sei é que meu coração dispara ao lembrar dos olhos daquela mulher. Se aquilo não era um milagre, quem poderia me explicar?

* Alguns nomes e fatos foram modificados.
     
     

domingo, 25 de maio de 2014

Quem sabe me torne bela.

Fechei os olhos pra fingir que nada via.
Sonhos são apenas sonhos.
Não luto em guerras perdidas.

Meu melhor amigo se foi.
Mas fui eu que reneguei os dons.
E chorei sem ninguém perceber.
Minha alma partiu com ele.

Vou esperar por mais mil anos.
Quem sabe, me torne bela.
E cheia de encantos que nunca tive.

Vou esperar por mais mil anos.
Quem sabe, me torne especial.
E conquiste amores que nunca tive.

Minha música virou cliché.
Meu livro me fez chorar.
Meu sentimento me envergonhou.

Estou morta.
Mortos não sentem.
Estou morta.
Mortos não amam.

Fechei os olhos e fingi que não chorava
Perdi a aposta, sem mesmo jogar.
Não luto em guerras perdidas.

Quem sabe me torne bela.
Quem sabe me torne bela.
Quem sabe me torne bela.

Vou esperar por mais mil anos.